O Tibagi desce 366 metros
e chega à cidade memorial
Entre as belezas de Tibagi, o Salto Santa Rosa
Por do Sol na Rodovia do Café
Salto Puxa Nervos, em Tibagi
Nos primeiros 88
quilômetros, entre a nascente e Uvaia, o rio Tibagi desce – literalmente – 197
metros, de 1.060 a 972. Uvaia,
distrito ponta-grossense, é a primeira comunidade ribeirinha e dali até a
cidade do Tibagi são mais 118 quilômetros de curso fluvial. “Calmo e equilibrado” até o ponto em que recebe o Pitangui, seu maior afluente, o Tibagi volta a se agitar oito quilômetros
adiante: são quatro corredeiras e pequenos saltos até a cidade homônima, constatou o geógrafo Reinhard Maack.
Entre a Serrinha, onde nasce, e a
cidade do Tibagi, o rio tem 206 quilômetros e deslocou-se da altitude de 1.060
metros para 694 (menos 366). O trecho de corredeiras, menos acessível, ainda
tem as margens protegidas por matas.
Conforme a hidrografia no Atlas do Paraná, ao atingir a cidade do Tibagi o rio recebeu 17 afluentes, entre os quais o Lajeado da Cotia, o Ribeirão do Palmito, o Rio Sabão, o Arroio Bom Sucesso. E fazmparte do panorama urbano. A cidade é um memorial dos tempos idos, onde se
ouvem histórias cujos personagens são o latifundiário, o garimpeiro, o índio e o tropeiro, o político e o sertanista. Por
exemplo, os exploradores Telêmaco Borba e Edmundo Alberto Mercer.
Já entre 1726 e 1739 a Coroa
Portuguesa liberava grandes extensões – as sesmarias – que tinham por
referência o rio Tibagi, aonde surgiria a vila, hoje cidade, tendo sido
contemplados pelo menos 17 requerentes no período. No “Mapeamento das Sesmarias
do Paraná Século 17 e 18”, organizado por Maria Lourdes Ritter, aquelas
concessões situavam-se nos “Campos do Tibagi”. Grande
parte dos sesmeiros não se fixavam; só meio século depois chegou José Félix da
Silva, que contribuiria para e efetiva ocupação. É mencionado também como José
Félix do Canto e Silva e José Félix da
Silva Passos, que obteve a sua primeira sesmaria em 20 de maio de 1788, uma
faixa de três léguas de comprimento por uma légua de largura entre os rios
Alegre e Faisqueira, afluentes do Tibagi, fechando-se o perímetro com o limite
no ribeirão Bromado. Uma légua de sesmaria equivale a 6.600 metros.
Para se fixar, José Félix combate os
caingangues. E vencendo-os, aumenta o latifúndio. Os detentores de títulos de
sesmarias podiam vendê-los e José Félix comprou 21 mil alqueires; a seguir
solicitou e lhe foi concedida pela Coroa a maior extensão: 65 mil alqueires.
Esse número fabuloso é relatado por Hellê Vellozo Fernandes, historiadora da
Indústria Klabin, no livro Monte Alegre, Cidade Papel – editado em 1974.
Assim, na primeira década de 1800 o latifúndio de José Félix abrangia 86 mil alqueires.
A maior sesmaria teria sido um
prêmio a José Félix pela matança de caingangues comandada por ele. Obstáculo à
ocupação das terras requeridas, os índios invadiam plantações, matavam animais
e pessoas; por vezes impediam a passagem dos tropeiros. Caingangues, também
chamados coroados, pelo corte raso do cabelo formando uma rodela ou coroa acima
da nuca.
A chacina
do Tibagi
José Félix e sua gente, incluindo
100 escravos, eram frequentemente atacados na Fazenda Fortaleza pelos índios.
Sucedeu que um grupo deles matou Brígido de Castro, amigo de Félix, e espetou a
cabeça num dos portões da fazenda, com uma flecha em cada olho.
Sob o comando de José Félix e seu
capataz, Antônio Machado Ribeiro, um grupo armado alcança os caingangues a 50
quilômetros da Fazenda Fortaleza. E matam todos, até crianças e mulheres.
Talvez uma mistura de lenda e veracidade, “a tradição registra um espetáculo de
crueldade sem par”, no lugar onde tempos depois haveria o hospital e o Hotel
Ikapê, em Mone Alegre (atualmente município de Telêmaco Borba). O sangue tingiu
o córrego ali e os corpos ficaram à mercê dos urubu. Conforme o registro de
Hellê Fernandes, a “chacina do Tibagi” deu nome ao lugar: “mortandade”. Assim
conhecido até ser mudado 150 anos mais tarde.
Nenhum comentário:
Postar um comentário