A burguesia do mate
supera os fazendeiros
Widson Schwartz
Rodovia do Café - entre Ponta Grossa e Curitiba
Museu em Castro - PR
Museu em Castro - PR
Em 1870, a
erva-mate se mantém privilegiada “nos quadros das exportações paranaenses,
enquanto assiste-se ao declínio (…) da pecuária”, expõe Carlos Antunes dos Santos
em A História da
Alimentação no Paraná (Juruá
Editora – 2007). “A classe dos criadores não detinha mais o poder político na
Província, substituída que fora pela burguesia do mate, instalada no setor
urbano.”
O imposto sobre
animais, que representava 70% da receita pública ao instalar-se a Província,
declina irreversivelmente. “Percorrendo os Campos Gerais, de que se tem feito
tão belas descrições sempre aquém da realidade, notei que a criação de gado ali
não corresponde à grande extensão dos pastos”, afirma o presidente provincial,
Lamenha Lins, no relatório de 15 de fevereiro de 1876 à Assembleia Legislativa.
“Fazendas de três a quatro léguas, de magníficos campos, contém apenas 600 a 800 reses (…) os fazendeiros,
levados pelo lucro fácil e grande (…) com as invernadas das tropas vindas do
sul, deixaram a criação quase que completamente abandonada.”
As exportações de
erva-mate, por empresários de Curitiba e do litoral, são a principal fonte de
impostos da Província desde 1860.
Encerra-se em 1897
a Feira de Sorocaba, que
havia começado em 1733, estimando-se que tenha comercializado 2,6 milhões de
animais nos 164 anos. De dois mil animais por ano, em média, nas primeiras duas
décadas, a Feira avolumou-se no decorrer de um século, atingindo o máximo de
100 mil cabeças/ano, entre 1856 e 1860. Contribuíra, a partir de 1830, o advento da cafeicultura no Vale do Paraíba,
confluência de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais.
Repentinamente,
após 1860, a Feira declinou para cinco mil animais/ano. Exauria-se a mineração
e surgiam as ferrovias, novo transporte do café. O tropeirismo cessou nas
longas distâncias e permaneceu em algumas regiões até 1930.
A memória do ciclo
está no Museu do Tropeiro, em Castro, inaugurado em 1977 com documentos e 400 objetos.
Tropeiro: Alma sem Fronteira, audiovisual produzido em 2004, é
contribuição do cineasta Homero Camargo Ribas. Publicitário e jornalista,
Homero Camargo teve um avô tropeiro: Argemiro Camargo Ribas, que comprou a
Fazenda Fortaleza em 1906. Cooperativa Cinema e Mídias Digitais é a sua
empresa, coprodutora de “Os Xeretas” e “Sonhos Tropicais”, longas metragens que
entraram no circuito comercial brasileiro.
Endereço de
Homero: Fazenda Curucaca, em Ventania. Dali ele mantém o foco na história e na
paisagem regionais, temas de outras realizações suas, entre as quais O
Brasil de Saint Hilaire – Os Campos Gerais.
Fazenda Fortaleza
e o Bom Jesus hoje
Equidistante 20
quilômetros de Tibagi e Ventania, a Fazenda Fortaleza situa-se à margem da
BR-153, com 1.300 alqueires. Pertence à família Ribas Mattos. A casa construída
por volta de 1800 e ampliada em 1942, mantém as paredes originais, de taipa. Pela descrição de Thomas Bigg-Wither, em 1874
era um “grande e maciço edifício (...) de madeira e barro”. Da varanda, a “aba
do telhado se projetava além das paredes, apoiada em pilastras” e com baixa
altura até ao muro. A construção de taipa, que era também a dos muros ao redor,
“dura séculos”, anotou o visitante. Tanto desafiava aos ataques de índios, aos
quais havia resistido, quanto às influências atmosféricas.
O Bom Jesus da
Cana Verde, ou de Fortaleza, permanece na fazenda há mais de dois séculos. Do
tamanho de um homem normal, a imagem de madeira chegou com os escravos de José
Félix. Tida por milagrosa, não se sabe quem a esculpiu. Inspirou a tradição, já
no século 20, de se doar ao Bom Jesus o primeiro bezerro do ano em propriedades
da região, para que se mantivesse a capela e a festa, a 6 de agosto. Figurou no
calendário turístico da Paranatur e cessou na década de 1980.