Araucária e rios límpidos
no caminho do naturalista - Widson Shwartz
Os Campos Gerais são “uma dessas
porções de território que, em todos os países, se distingue, independentemente
das divisões política, pelo aspecto, a natureza de suas produções e o solo”,
impressionou-se Saint-Hilaire em 1820. “Estes campos são, certamente, uma das
mais belas regiões que percorri quando estive na América.”
A topografia “não estreita limites à
vista” e o viajante contempla a majestosa araucária, que, “por sua elevação, a
elegante majestade de suas formas, sua imobilidade, o verde escuro de sua
folhagem, contribui mais para dar uma feição particular aos Campos
Gerais”. Quanto aos rios, em sua maioria
“correm límpidos e rápidos sobre as rochas aplastadas”, entre os quais o Tibagi
e o Caxambu “arrastam diamantes que param nos caldeirões”. Saint-Hilaire
explica que os caldeirões são “buracos” no leito rochoso, escavados pelo
impacto de quedas d´água, nos quais “contrabandistas” recolhiam diamantes
tempos atrás.
A “vasta extensão” dos Campos
Gerais, mencionada por Saint-Hilaire, viria a ser o “termo” de Castro, por uma
lei de 10 de março de 1842, que dividiu a 5.ª Comarca de São Paulo em três
“termos”, Paranaguá e Curitiba os outros.
O “termo” – ou jurisdição – de Castro abrange as
freguesias de Jaguariaíva e de Ponta Grossa, os povoados de Tibagi, de Furnas,
Piraí, São João do Cristianismo, Carrapatos, Conchas, Cupim e outros. Limita-se
a nordeste pelo rio Itararé, separando-o de Itapeva; e ao sul pelo Tibagi, que
o separa do “termo” de Curitiba. A oeste e ao norte o “termo” de Castro é
“fechado” pelas terras ocupadas por índios bravios e a leste, pela floresta.
Essa descrição corresponde a uma atualização feita por Saint-Hilaire trinta
anos depois de sua viagem. Palmeira
ficava no termo de Curitiba.
Quando D. Pedro II visita os Campos
Gerais, em 1880, a comarca de Castro ocupa 174 mil km²; a Província teria 250 mil km², estendendo-se também a uma
divisa com o Rio Grande do Sul. De toda a extensão paranaense, 28 mil km² seriam desmembrados para Santa
Catarina.
Na emancipação, em 1853, a Província
do Paraná tinha 62.358 habitantes, dos quais 10.189 escravos, 16,3%. Já em 1820
Saint-Hilaire observara que os Campos Gerais “gozam de uma vantagem” que o
visitante não devia “deixar em silêncio: a criação do gado, em que geralmente
todos se ocupam, exige poucos escravos, enquanto a fabricação do açúcar e o
trabalho nas minas necessitam número muito grande deles”. O rico coronel Luciano Carneiro, em
Jaguariaíva, tinha apenas 30 escravos. E não havia mais de 500 escravos “em
todo o termo da cidade de Castro”, para um pequeno número de proprietários.
Meio século depois, em 1874, o censo
constataria 10.560 escravos entre os 126.692 habitantes na Província paranaense.
A tradução por
David Carneiro
Viajando pelo sudeste, centro-oeste
e sul do Brasil, Saint-Hilaire coletou informações sobre 24 mil espécies da
flora e da fauna. Augustin – ou Auguste
– François Cezar Prouvençal de Saint-Hilaire tinha 20 anos quando chegou, em
1817. Regressou à França em 1822 e assumiu a cadeira de Botânica na Faculdade
de Ciências de Paris em 1830.
Em 1849, publicou “Viagens na
Comarca de Curitiba em 1820”, livro que seria traduzido por David Carneiro na
década de 1930. Sua obra mais extensa, “Flora Brazilis Meridionalis — história e descrição de todas
as plantas que cruzam províncias do Brasil”, saiu em 1851.
De uma nobre família de Orleans,
Saint-Hilaire morreu em 1854, ano seguinte à emancipação paranaense. A sua
tradução por David Carneiro foi publicada pela primeira vez em 1938, edição de
“Amigos do Livro e das Belas Artes (Alba)” - Curitiba.