terça-feira, 5 de março de 2013


A burguesia do mate
supera os fazendeiros
Widson Schwartz

 Rodovia do Café - entre Ponta Grossa e Curitiba

 Museu em Castro - PR 

Museu em Castro - PR 

          Em 1870, a erva-mate se mantém privilegiada “nos quadros das exportações paranaenses, enquanto assiste-se ao declínio (…) da pecuária”, expõe Carlos Antunes dos Santos em A História da Alimentação no Paraná (Juruá Editora – 2007). “A classe dos criadores não detinha mais o poder político na Província, substituída que fora pela burguesia do mate, instalada no setor urbano.”
          O imposto sobre animais, que representava 70% da receita pública ao instalar-se a Província, declina irreversivelmente. “Percorrendo os Campos Gerais, de que se tem feito tão belas descrições sempre aquém da realidade, notei que a criação de gado ali não corresponde à grande extensão dos pastos”, afirma o presidente provincial, Lamenha Lins, no relatório de 15 de fevereiro de 1876 à Assembleia Legislativa. “Fazendas de três a quatro léguas, de magníficos campos, contém  apenas 600 a 800 reses (…) os fazendeiros, levados pelo lucro fácil e grande (…) com as invernadas das tropas vindas do sul, deixaram a criação quase que completamente abandonada.”
          As exportações de erva-mate, por empresários de Curitiba e do litoral, são a principal fonte de impostos da Província desde 1860. 
          Encerra-se em 1897 a Feira de Sorocaba, que havia começado em 1733, estimando-se que tenha comercializado 2,6 milhões de animais nos 164 anos. De dois mil animais por ano, em média, nas primeiras duas décadas, a Feira avolumou-se no decorrer de um século, atingindo o máximo de 100 mil cabeças/ano, entre 1856 e 1860. Contribuíra, a partir de 1830, o  advento da cafeicultura no Vale do Paraíba, confluência de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais.
          Repentinamente, após 1860, a Feira declinou para cinco mil animais/ano. Exauria-se a mineração e surgiam as ferrovias, novo transporte do café. O tropeirismo cessou nas longas distâncias e permaneceu em algumas regiões até 1930.   
          A memória do ciclo está no Museu do Tropeiro, em Castro, inaugurado em 1977 com documentos e 400 objetos. Tropeiro: Alma sem Fronteira, audiovisual produzido em 2004, é contribuição do cineasta Homero Camargo Ribas. Publicitário e jornalista, Homero Camargo teve um avô tropeiro: Argemiro Camargo Ribas, que comprou a Fazenda Fortaleza em 1906. Cooperativa Cinema e Mídias Digitais é a sua empresa, coprodutora de “Os Xeretas” e “Sonhos Tropicais”, longas metragens que entraram no circuito comercial brasileiro. 
          Endereço de Homero: Fazenda Curucaca, em Ventania. Dali ele mantém o foco na história e na paisagem regionais, temas de outras realizações suas, entre as quais O Brasil de Saint Hilaire – Os Campos Gerais.


Fazenda Fortaleza
e o Bom Jesus hoje


          Equidistante 20 quilômetros de Tibagi e Ventania, a Fazenda Fortaleza situa-se à margem da BR-153, com 1.300 alqueires. Pertence à família Ribas Mattos. A casa construída por volta de 1800 e ampliada em 1942, mantém as paredes originais, de taipa. Pela descrição de Thomas Bigg-Wither, em 1874 era um “grande e maciço edifício (...) de madeira e barro”. Da varanda, a “aba do telhado se projetava além das paredes, apoiada em pilastras” e com baixa altura até ao muro. A construção de taipa, que era também a dos muros ao redor, “dura séculos”, anotou o visitante. Tanto desafiava aos ataques de índios, aos quais havia resistido, quanto às influências atmosféricas.
          O Bom Jesus da Cana Verde, ou de Fortaleza, permanece na fazenda há mais de dois séculos. Do tamanho de um homem normal, a imagem de madeira chegou com os escravos de José Félix. Tida por milagrosa, não se sabe quem a esculpiu. Inspirou a tradição, já no século 20, de se doar ao Bom Jesus o primeiro bezerro do ano em propriedades da região, para que se mantivesse a capela e a festa, a 6 de agosto. Figurou no calendário turístico da Paranatur e cessou na década de 1980.